domingo, 18 de setembro de 2011

Sanatório


Eu vivo em um mundo onde não há mais respeito, não há sensibilidade ou afeto verdadeiro. As pessoas se esbarram, se abraçam e se fodem loucamente para sentir um pouco mais vivas dentro de si mesmas, num frenesi sem sucesso. O desamor emana pelas narinas dos desumanos, a falsidade lava as ruas e as deixa com o cheiro limpo da podridão. A Podridão não é novidade por aqui.
Aqui não existe carinho. Aqui há animais que mordem uns aos outros durante a noite, se tocam sem pedir permissão, se beijam e se fingem estar amando, e a pretensão do fingimento no dia seguinte varre as memórias, e não se lembra nomes, não se lembra números, não se lembra nada. Aqui não há aproximação.
Eu vivo em um mundo onde a frieza é passada de pai pra filho, ventre a ventre. Onde os rasgos da vida particular não interessam a ninguém, onde copos (e corpos) são quebrados em praça pública e depois ninguém se importa, porque a embriaguez generalizada dos bichos justifica qualquer ação – ou desação – insana.
Eu vivo em um mundo que está me consumindo. Como zumbis que me tiram aos poucos os pedaços de dignidade e sensatez, estou ficando como um deles. Porque aqui, pessoas como eu são tratadas como loucos, como leprosos sujos que não podem chegar mais perto, porque humanidade contagia. Aqui levamos dardos enormes de decepção na veia, e aos poucos ficamos sedados com o som da solidão, e a droga toda sangra por dentro, e nos faz ver que no fim de tudo, é melhor – ou cômodo – se juntar a eles.
Eu vivo num mundo que está desistindo de si mesmo, em um mundo que sente a falta da elevação do espírito, da penetração do amor na alma, mas não se deixa admitir, por orgulho e estupidez... Eu vivo num mundo de surdos, cegos e pobres, que retalham a pele dos que ainda vivem, e gozam do prazer vazio de invadir o espaço alheio, e vão embora depois sem a menor satisfação. Eu vivo no mundo do estupro, eu vivo sendo assaltada por clandestinos que se fingem ser como eu.
Aqui ninguém segura a minha mão, aqui ninguém me abraça porque quer. Aqui me sufocam com os braços escuros num mar de mentiras. Aqui o ar poluído me afoga em mim mesma.
Aqui eu deixo minhas últimas súplicas,aqui eu derramo os últimos goles de lucidez. Aqui eu me agarro aos poucos que restam.

2 comentários:

Ricardo Marini disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Ricardo Marini disse...

Achei o seu blog via Facebook e gostei muito dos textos, em especial um chamado "Sobre Leões e Cordeiros". As suas descrições, seja do ambiente ou mesmo do estado de espírito, são maravilhosas. Parabéns! :)